ANTÓNIO BREDA CARVALHO versus ANTÓNIO TAVARES e o Humor nos novos romancistas portugueses

Sou apenas uma leitora. E nem mesmo uma leitora plenamente conhecedora da obra de António Breda Carvalho e António Tavares.
É pois, da minha experiência de “OS AZARES DE VALDEMAR SORTE GRANDE” (Breda) e de” O CORO DOS DEFUNTOS” (Tavares) que me proponho comentar e aguçar o desejo e apetite dos leitores.
Em ambos os escritos me parece estar presente a herança a que se convencionou chamar “realismo mágico”, cujo magíster foi Gabriel Garcia Marquez , tendo como expoente máximo, “Cem anos de solidão” . Em Tavares, olha-se a realidade com vestes de imaginário para desenhar um mundo já ido e tão distante de uma realidade coeva, dita moderna. Em Breda, toda a narrativa joga com o inverosímil que de repente se torna real e vice-versa.
Duas formas distintas, em termos de estrutura: Em Tavares, os quadros, os capítulos breves, como forma de prender o leitor, cada vez mais apressado e voraz. Em Breda, o romance extenso a provar que também ele pode prender esse leitor, pela trama que se sucede.
Ambos os escritores têm consciência do forte peso do passado literário e de como é difícil inovar e prender, seduzir o leitor.
Em Tavares esse peso é invocado diretamente, através da convocação expressa da obra de Aquilino Ribeiro. Nomeadamente, do seu vocabulário que constitui glossário a consultar no final do livro. Mas, se o leitor não o fizer, encontrará aquele discurso que lembra um texto truncado de vogais, mas que o cérebro humano lê normalmente como se estivesse completo. Ironia: se não consulta o glossário, o leitor entenderá perfeitamente a prosa do romancista; se o consultar, terá o prazer de revisitar a prosa de um outro a que a língua tanto deve, mas que tal como mundo retratado já não é visível e inteligível hoje, a não ser através da literatura.
Em Breda, a literatura e a sua história são incorporadas no novo discurso e é ao peso da crítica literária que ele se dirige. Essa crítica, o leitor privilegiado, tem até um nome: “Judas”… A quem amiúde interpela: “...outra metáfora, Judas…”; “… Não quero massacrar-te” com uma dada descrição; “Já te disse, não falo para encher farinheiras”; “Consola-te com os milhentos romances que esgotam páginas dissecando a vida infantil das personagens.” Em Breda não podemos escapar à reiterada intenção de brincar, desabafar, desafiar um leitor privilegiado.
Em Tavares, é um narrador que se nos apresenta como “Diz ela”, no feminino, que vai contando e se responsabiliza pelos factos narrados. Por mais curiosidade que nos desperte esta narradora, aquela não será satisfeita, a não ser saber que “estudou filosofia”.
Como afirma a teoria literária, a escrita é arte e é labuta. Sem dúvida que tal se aplica a estes novos romancistas. Mas, o que mais sobressai é o enorme prazer e gozo que essa labuta proporciona ao escritor, visível no humor da sua escrita, ao mesmo tempo que se exorcizam fantasmas do presente e do passado, do eu interior e do eu colectivo.

Teresa Miranda